Na busca por processos mais ágeis e seguros, construção civil mira em novas matérias primas e no reaproveitamento de resíduos
Reduzir gastos, poluir menos e ter a capacidade de construir ambientes mais confortáveis e duradouros estão entre os desafios de engenheiros e projetistas. Aliar a construção civil com a sustentabilidade é tarefa que exige inovação e investimento em pesquisa e tecnologia. “A área de construção é muito conservadora e sempre esteve baseada em métodos artesanais. Demorou para o setor perceber que é necessário acompanhar as tendências do mundo e aplicar métodos e materiais mais modernos”, explica Eloy Casagrande, professor de engenharia da Universidade Tecnológica Federal no Paraná (UTFPR).
O setor da construção civil é responsável por consumir um terço dos recursos naturais e produz cerca de 40% de todo o lixo sólido do planeta, de acordo com dados do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS). A adoção de medidas mais saudáveis para o meio ambiente passa pela busca de métodos renovados. “Com as tecnologias existentes no mercado, o consumo de energia pode ser reduzido entre 30% e 50% sem acréscimos significantivos de custos e sem perda do conforto e da qualidade do ambiente construído”, afirma Marcelo Takaoka, presidente do CBCS.
Para ser sustentável e, por conseqüência, mais barata e inovadora, a obra tem de ser diferente desde o projeto. “Temos estimulado nossos projetistas a pensar em soluções tecnológicas desde o conceito do desenho da planta. Estamos testando alguns programas que modelam o projeto em 3D e isso melhora o uso dos materiais, porque podemos visualizar a geometria e a volumetria da construção antes de partir para o canteiro de obras”, comenta Cássia Assumpção, engenheira civil da construtora Laguna.
Segundo ela, a construção teve de encarar impasses para só então buscar a inovação em seus processos. “As empresas estão buscando redução de preço, menor dano à natureza, agilidade na obra e as tecnologias de construção vêm para isso, passam a ser necessidade e agregam mais valor ao produto final”, afirma.
A construção civil também busca o caminho da modernização e sustentabilidade por causa da limitação de recursos naturais. “Tijolo e madeira para construção, por exemplo, são matérias primas limitadas, que tendem a ficar mais caras”, aponta a engenheira. Por isso, a tecnologia faz parte do caminho sem volta da construção civil. “Ainda há muita gente do setor que acredita que a tecnologia é um mito, um tabu, mas teremos de deixar os velhos modelos tradicionais para acompanhar a necessidade do mundo”, observa Cássia.
Opções
A engenheira comenta que, entre as inovações mais presentes nos projetos da empresa estão as fachadas unitizadas, que são placas pré-moldadas para a finalização da fachada do edifício. “Nós levamos os painéis prontos e montamos as peças, o que confere maior segurança para a mão-de-obra que está no canteiro e o controle da finalização também é maior”, explica. “Não temos alvenaria e profissionais usando balancinhos para montar fachadas”, acrescenta.
A uniformização de etapas na construção também torna mais rápida a obra e significa menor custo para o construtor. Em vez de assentar tijolo por tijolo, obras da construtora Dória testam paredes concretadas fora da obra, em blocos, que podem ser usadas direto no canteiro. “O processo facilita em questão de tempo e mão-de-obra, porque condensa um ciclo de atividade, que é a fase das paredes”, explica Carlos German, diretor técnico da empresa. De acordo com ele, é possível diminuir pela metade o tempo para finalizar um pavimento de um prédio.
Tijolos prometem mais conforto térmico
A Duraeco, empresa que existe há nove meses, sediada em Fazenda Rio Grande, na Região Metropolitana de Curitiba, está produzindo tijolos ecológicos a partir de matérias primas alternativas. O produto promete mais conforto térmico e acústico para os imóveis e, ainda, custos finais da obra de 20% a 30% menores que aqueles exigidos pela estrutura convencional. O produto, feito pela prensagem de uma mistura de saibro, cimento e polímeros, também consome menos energia porque não depende de ir ao forno para a cura (nome que se dá ao tempo necessário para endurecimento do produto).
A matéria prima será, em breve, substituída: a intenção da empresa é utilizar o resíduo triturado da construção civil, além de pó de porcelanato, palha de arroz, fibra de bambu e até lodo. “Existem essas possibilidades e vamos manter os testes, mas tornar o produto mais viável”, explica um dos sócios da Duraeco, Robson Calvo.
A unidade da empresa é considerada um laboratório. “Por enquanto estamos testando nossos processos para observar como se comporta o produto e o que podemos melhorar nele”, explica Calvo. O investimento na firma já foi na ordem de R$ 300 mil, mas garante que o resultado será um produto com garantia. “Fizemos parceria com instituições de ensino e nossa intenção é investir em qualidade para ter um tijolo de elevado nível profissional”, diz. Atualmente, a empresa produz três mil tijolos por dia. Com a finalização da fábrica, a intenção é produzir 10 mil tijolos por dia e comercializar até 20 milheiros do produto por mês.
A intenção de fabricar um produto de qualidade vem da experiência pessoal dos sócios. “Compramos nossos primeiros imóveis e tivemos várias decepções. As construtoras não tinham nenhum cuidado com o meio ambiente e ainda ofereciam um produto ruim. O que queremos fazer é não frustrar o sonho de alguém que compra um imóvel e isso passa também pela qualidade do tijolo da construção”, comenta.
Trabalhar sustentabilidade no setor da construção civil traz oportunidades de negócios para toda a cadeia envolvida. “Empreendedores, sistema financeiro, governo e sociedade são beneficiados, já que a criação de empregos verdes contribui para a geração de riquezas e para melhoria na qualidade vida das pessoas nos espaços construídos”, completa Marcelo Takaoka, presidente da CBCS.
Testes indicam possibilidade de comercialização
O Escritório Verde, projeto mantido pela UTFPR em parceria com uma série de empresas e instituições paranaenses, tem como objetivo tornar realidade a redução do impacto ambiental na construção civil. Eloy Casagrande, professor que coordena a iniciativa, explica que o grupo envolvido planeja e produz materiais que podem ser utilizados nas obras. “Além disso, na construção do nosso escritório, utilizamos alguns materiais desenvolvidos aqui para testá-los e entender como eles reagem no dia a dia”, explica.
O deck do local foi feito com madeira plástica, que é feita com serragem e plástico reciclado. Os testes indicam que o material tem maior durabilidade, mas o uso efetivo na construção dá mais confiança para o produto. “Usamos mantas de garrafas pet que foram recicladas para o isolamento térmico das paredes. Assim, reaproveitamos material que era um problema ambiental e criamos um produto competitivo no mercado”, afirma o professor. A manta de isolamento acústico usada nas paredes do Escritório Verde é feita com pneus rejeitados.
“Temos muitas tecnologias e algumas bem conhecidas, como energia solar e coleta da água da chuva, que pode causar modificação na construção, mas que, a longo prazo, haverá ganho econômico e ambiental. O que temos de fazer é mostrar que é possível utilizá-las”, completa o professor.
Fonte: Gazeta do Povo